
Nara
1968
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Lindonéia (Caetano Veloso e Gilberto Gil)
Na frente do espelho
Sem que ninguém a visse
Miss, linda, feia
Lindonéia desaparecida
Despedaçados
Atropelados
Cachorros mortos nas ruas
Policiais vigiando
O sol batendo nas frutas
Sangrando
Oh, meu amor
A solidão vai me matar de dor
Lindonéia, cor parda
Fruta na feira
Lindonéia solteira
Lindonéia, domingo
Segunda-feira
Lindonéia desaparecida
Na igreja, no andor
Lindonéia desaparecida
Na preguiça, no progresso
Lindonéia desaparecida
Nas paradas de sucesso
Ah, meu amor
A solidão vai me matar de dor
No avesso do espelho
Mas desaparecida
Ela aparece na fotografia
Do outro lado da vida
Despedaçados, atropelados
Cachorros mortos nas ruas
Policiais vigiando
O sol batendo nas frutas
Sangrando
Oh, meu amor
A solidão vai me matar de dor
Vai me matar
Vai me matar de dor -
Quem é (Custódio Mesquista e Joracy camargo)
Quem é que muda os botõezinhos da camisa
quem é que diz um adeusinho no portão
e de manhã não faz barulho quando pisa
e quando pedes qualquer coisa não diz não.
Quem é que sempre dá um laço na gravata,
quem é que arruma teus papéis na escrivaninha
quem é que faz o teu bifinho com batatas
e esfrega tanto as lindas mãos lá na cozinha.
E no entretanto é só você que não me liga
e ainda descobre sempre em mim cada defeito
pois é talvez porque eu sou muito sua amiga
e nunca estás por isso mesmo satisfeito.
Quem é que reza por você lá no oratório
quem é que espera por você sempre chorando
quem é que sabe que não paras no escritório
e acredita que estivestes trabalhando.
Quem é que trata dos botões da tua roupa
quem é que mais economiza luz e gás
quem é que sopra no jantar a tua sopa
quem é que diz no telefone que não estás.
E no entretanto você pensa em me deixar
leva dizendo que eu sou qual não sei o que
e no entretanto você vai me abandonar
mas é porque eu sou louquinha por você. -
Donzela por piedade não perturbes (J.S. Arvelos)
Donzela por piedade não perturbes
A paz que se abrigou no peito meu
Ah não venhas com teus cantos de ilusões
Recordar um amor que já foi teu.
Amei-te sim ó virgem, amei-te
Tanto quanto um coração amar podia
No verdor dos meus anos consagrei-te
Aos enlevos de meiga poesia -
Mamãe Coragem (Caetano Veloso e Torquato Neto)
Mamãe, mamãe não chore
A vida é assim mesmo eu fui embora
Mamãe, mamãe não chore
Eu nunca mais vou voltar por aí
Mamãe, mamãe não chore
A vida é assim mesmo eu quero mesmo é isto aqui
Mamãe, mamãe não chore
Pegue uns panos pra lavar, leia um romance
Veja as contas do mercado, pague as prestações
Ser mãe é desdobrar fibra por fibra os corações dos filhos
Seja feliz, seja feliz
Mamãe, mamãe não chore
Eu quero, eu posso, eu quis, eu fiz, Mamãe, seja feliz
Mamãe, mamãe não chore
Não chore nunca mais, não adianta eu tenho um beijo preso na garganta
Eu tenho um jeito de quem não se espanta (Braço de ouro vale 10 milhões)
Eu tenho corações fora peito
Mamãe, não chore, não tem jeito
Pegue uns panos pra lavar leia um romance
Leia "Elzira, a morta virgem", "O Grande Industrial"
Eu por aqui vou indo muito bem , de vez em quando brinco Carnaval
E vou vivendo assim: felicidade na cidade que eu plantei pra mim
E que não tem mais fim, não tem mais fim, não tem mais fim -
Anoiteceu (Vinícius de Moraes e Francis Hime)
A luz morreu, o céu perdeu a cor
Anoiteceu no nosso grande amor
Ah! Leva a solidão de mim
Tira esse amor dos olhos meus
Tira a tristeza ruim do adeus
Que ficou em mim
Que não sai de mim
Pelo amor de Deus.
Vem suavizar a dor
Dessa paixão que anoiteceu
Vem e apaga do corpo meu
Cada beijo seu
Porque foi assim
Que ela me enlouqueceu.
Fatal, cruel,
Cruel demais
Mas não faz mal
Quem ama não tem paz. -
Modinha (Serestas – peça n°5) (Heitor Villa Lobos e Manduca Piá)
Na solidãio da minha vida
Morrerie querida do teu desamor
Muito embora me desprezes
Te amarei constante
Sem que a ti distante
Chegue a luz de triste voz
Do trovador.
Feliz te quero mais se um dia
Toda essa alegria se mudaase em dor
Ouvirias do passado
A voz do meu carinho
Repetir baixinho
Meretriste confissão
Do meu amor. -
Infelizmente (Ary Pavão e Lamrtine Babo)
Eu tenho inveja dos mocinhos da Avenida
de ombros largos e elegância nos quadris
Roupa lavada, casa, luz e até comida
Tudo de graça, ó que gente tão feliz!
Infelizmente eu trabalho muito!
Conheço um "cabra" que tem sorte até comendo
Freqüenta um "china" bem ali na rua Sete
Um dia desses, vejam só, caso estupendo!
Achou um relógio na barriga de um croquete!
Infelizmente eu almoço em casa!
Eu quando vejo um baile de alta-sociedade
Lindas casacas, toaletes formidáveis
de terno-saco dou uma volta na cidade
Tomo uma média, vão-se os níqueis miseráveis
Infelizmente sou da classe-média!
Se me apresentam uma menina espevitada
que bebe e fuma e dança o fox-trot blue
finjo que entendo e afinal não entendo nada
Envergonhado, cabisbaixo, jururu!
Infelizmente já passei da idade! -
Odeon (Ernesto Nazareth e Vinícius de Moraes)
Ai, quem me dera
O meu chorinho
Tanto tempo abandonado
E a melancolia que eu sentia
Quando ouvia
Ele fazer tanto chorar
Ai, nem me lembro
Há tanto, tanto
Todo o encanto
De um passado
Que era lindo
Era triste, era bom
Igualzinho a um chorinho
Chamado odeon
Terçando flauta e cavaquinho
Meu chorinho se desata
Tira da canção do violão
Esse bordão
Que me dá vida
Que me mata
É só carinho
O meu chorinho
Quando pega e chega
Assim devagarzinho
Meia-luz, meia-voz, meio tom
Meu chorinho chamado odeon
Ah, vem depressa
Chorinho querido, vem
Mostrar a graça
Que o choro sentido tem
Quanto tempo passou
Quanta coisa mudou
Já ninguém chora mais por ninguém
Ah, quem diria que um dia
Chorinho meu, você viria
Com a graça que o amor lhe deu
Pra dizer "não faz mal
Tanto faz, tanto fez
Eu voltei pra chorar com vocês"
Chora bastante meu chorinho
Teu chorinho de saudade
Diz ao bandolim pra não tocar
Tão lindo assim
Porque parece até maldade
Ai, meu chorinho
Eu só queria
Transformar em realidade
A poesia
Ai, que lindo, ai, que triste, ai, que bom
De um chorinho chamado odeon
Chorinho antigo, chorinho amigo
Eu até hoje ainda percebo essa ilusão
Essa saudade que vai comigo
E até parece aquela prece
Que sai só do coração
Se eu pudesse recordar
E ser criança
Se eu pudesse renovar
Minha esperança
Se eu pudesse me lembrar
Como se dança
Esse chorinho
Que hoje em dia
Ninguém sabe mais -
Mulher (Custódio Mesquita e Sady Cabral)
Não sei
Que intensa magia
Teu corpo irradia
Que me deixa louco assim
Mulher
Não sei
Teus olhos castanhos
Profundos, estranhos
Que mistério ocultarão
Mulher
Não sei dizer
Mulher
Só sei que sem alma
Roubaste-me a calma
E a teus pés eu fico a implorar
O teu amor tem um gosto amargo
E eu fico sempre a chorar nesta dor
Por teu amor
Por teu amor
Mulher -
Medroso de Amor (Alberto Neponucemo e Juvenal Galeno)
Moreninha
Não sorrias com meiguice
Com ternura
Não sorrias com meiguice
Este riso de candura não desfolhes
Não sorrias
Que eu tenho medo de amores
Que só trazem desventuras.
Moreninha
Não me fites como agora
Apaixonada
Não me fite como agora
Moreninha
Este olhar toda elevada
Não desprendas
Não me fites
Pois assim derramas fogo
Em minh’alma regelada.
Moreninh, moreninha
Vai-te embora
Com teus encoantos maltratas
Moreninha vai-te embora
Eu fui mártir das ingratas quando amei
Ó vai-te embora
Hoje fujo das mulheres
Pois fui mártir das ingratas. -
Deus vos salve esta casa santa (Caetano Veloso e Torquato Neto)
Um bom menino perdeu-se um dia
Entre a cozinha e o corredor
O pai deu ordem a toda família
Que o procurasse e ninguém achou
A mãe deu ordem a toda polícia
Que o perseguisse e ninguém achou
Ó deus vos salve esta casa santa
Onde a gente janta com nossos pais
Ó deus vos salve essa mesa farta
Feijão verdura ternura e paz
No apartamento vizinho ao meu
Que fica em frente ao elevador
Mora uma gente que não se entende
Que não entende o que se passou
Maria amélia, filha da casa,
Passou da idade e não se casou
Ó deus vos salve esta casa santa
Onde a gente janta com nossos pais
Ó deus vos salve essa mesa farta
Feijão verdura ternura e paz
Um trem de ferro sobre o colchão
A porta aberta pra escuridão
A luz mortiça ilumina a mesa
E a brasa acesa queima o porão
Os pais conversam na sala e a moça
Olha em silêncio pro seu irmão
Ó deus vos salve esta casa santa
Onde a gente janta com nossos pais
Ó deus vos salve essa mesa farta
Feijão verdura ternura e paz -
Tema de “Os Inconfidentes” (Chico Buarque de Hollada / Cecília Meireles)
Toda vez que um justo grita
Um carrasco vem calar
Quem não presta fica vivo
Quem é bom mandam matar.
De um poema a Tiradentes, mártir da liberdade:
Do Caeté à Vila Rica
É tudo ouro e cobre
O que é nosso vão levando
E o povo aqui sempre pobre
Foi trabalhar para todos
E vede o que lhe acontece
Daqueles a quem servia
Já nem um mais lhe conhece
Quando a desgraça é profunda
Que amigo se compadece
Foi trabalhar para todos
Mas por ele quem trabalha?
Tombado fica seu corpo
Nessa esquisita batalha
Suas ações e seu nome
Por onde a glória os espalha
Gravadora: Philips
Arranjos e regências: Rogério Duprat
Produção: Manoel Barenbein
Técnicos de som: José Carlos, Stelio e João
Capa: Pedro Moraes (foto)
Estúdios Scatena (São Paulo)